Conhecidos sujões das grandes cidades, os cartazes lambe-lambe, que são colados em postes e muros, poluem com propagandas de todo o tipo. Mas uma tradicional gráfica paulistana, que já lucrou com essa poluição, hoje tem dado a eles um uso diferente.
Com mensagens inspiradas no grafite e produção artística, a Gráfica Fidalga tem vendido essas peças como item de decoração. A transformação tem ajudado a gráfica de 35 anos a se reerguer e a conquistar novos clientes entre empresas e consumidores em geral.
A guinada do lambe-lambe para o uso artístico veio após uma das fases mais difíceis da Fidalga, a Lei Cidade Limpa, que entrou em vigor em 2007 e proibiu anúncios de rua e outros tipos de publicidade na capital paulista.
"Não tínhamos mais freguesia nem ânimo para bater de frente com a lei", afirma Petrus Vieira, neto do fundador, Orlando da Silva Vieira. A crise piorou, e a Fidalga acabou fechando as portas por quatro anos, quando reabriu como um coletivo de amigos. "Quando retomamos, começamos a trabalhar com arte e poesia, passando da publicidade para um ramo artístico."
Na fase da crise, a gráfica, que funcionou por 19 anos na rua Fidalga, na Vila Madalena, mudou-se para a cidade de Taboão da Serra. Agora voltou para São Paulo, e está instalada no Butantã. Até hoje, os cartazes são feitos artesanalmente e impressos em uma máquina alemã Johhanesberg, de 1929, utilizando tipos talhados à mão.
Até que o novo uso ganhasse forma, foi necessário um trabalho árduo. "Eu mesmo bati em muita porta de galeria e colei muita poesia pelas ruas para que o nosso trabalho fosse notado e aceito como um dos braços da street art. Até que artistas, designers, arquitetos e decoradores enxergaram a possibilidade de trazer um pouco do cenário urbano para ambientes internos", afirma Petros.
Primeiros cartazes eram de movimentos sociais
A história da gráfica Fidalga se mistura às mudanças políticas e urbanas dos últimos 35 anos. Criada pelo avó de Vieira, ela produziu seus primeiros cartazes para movimentos sociais, sindicatos e partidos políticos de esquerda. A atividade considerada subversiva na época fez com que, na década de 1970, a gráfica fosse fechada pela ditadura militar.
Quatro máquinas Johhanesberg foram destruídas. Orlando foi preso e seus familiares, exilados, no Chile, Portugal e Senegal. Após o fim da ditadura, a Fidalga retomou suas atividades com uma máquina que havia ficado retida no Porto de Santos.
Atualmente, a gráfica Fidalga funciona em um imóvel no bairro do Butantã e conta com quatro funcionários. Apesar de não conseguir calcular o faturamento com exatidão, Vieira diz conseguir manter a gráfica operando com tranquilidade e dentro da lei. "O mais importante para nós é manter a gráfica aberta e não deixarmos morrer a arte do lambe-lambe", afirma.
Ofícios antigos são ameaçados pelas inovações do mercado
Empresas que trabalham com produtos ou serviços tradicionais e artesanais, como o pôster lambe-lambe, enfrentam desafios constantes, pois são ameaçadas pelas inovações que surgem diariamente no mercado. Para manter seus produtos valorizados, é preciso investir em imagem ou em outro apelo, como o emocional, segundo o consultor do Sebrae São Paulo Marcelo Sinelli.
"É preciso encontrar um nicho para atuar e dar uma roupagem nova ao produto", afirma. Fazer um trabalho de reposicionamento de marca pode ser uma boa estratégia. Um caso de sucesso, segundo ele, é o da marca Granado, que estava desgastada. "A Granado tinha parado no tempo. Hoje ela usa o apelo tradicional."
Para o especialista, o empresário de produtos tradicionais e artesanais tem a vantagem de ter um controle maior sobre a qualidade e pode até cobrar mais por isso. "Além disso, existe uma maior proximidade com o cliente, que deve ser aproveitada", diz.
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