Livro compila escândalos da era FHC
Por , iG São Paulo | - Atualizada às
O autor, o jornalista Palmério Dória, diz que o livro não é sobre o ex-presidente, mas sobre o "esquema" Fernando Henrique Cardoso
Foi o nebuloso processo de privatizações e não a estabilidade econômica alcançada por meio do Plano Real "a primeira e inesquecível marca do governo FHC". A conclusão é do jornalista Palmério Dória logo nas primeiras páginas do livro "O Príncipe da Privataria", lançado na semana passada pela Geração Editorial.
A conclusão acima exemplifica o tom impresso nas 399 páginas: uma compilação de escândalos públicos e privados dos oito anos de governo de Fernando Henrique Cardoso , com destaque especial para a compra de votos que viabilizou a aprovação no Congresso Nacional, em 1997, da emenda constitucional que garantiu a reeleição de FHC no ano seguinte.
Pela primeira vez o ex-deputado pelo PP do Acre e hoje influente empresário Narciso Mendes admite ser o Senhor X, personagem criado pelo jornalista Fernando Rodrigues, da "Folha de S. Paulo", na série histórica de reportagens que revelou o esquema de compra de votos capitaneado pelo ex-ministro da Comunicação Sérgio Motta.
A identidade secreta do Senhor X era há algum tempo um "segredo de polichinelo", segundo o próprio Dória. A novidade é que Mendes assumiu a autoria das gravações com os três ex-deputados acreanos que admitiram ter recebido R$ 200 mil cada para votar a favor da reeleição e embasaram a série de reportagens da "Folha".
Segundo Dória, Mendes decidiu se revelar depois de um problema de saúde. A revelação, espécie de âncora do livro, também aconteceu pouco depois de o filho do ex-deputado, o empreiteiro Narciso Mendes Jr., ser preso em uma operação da Polícia Federal por suspeita de fraudar licitações no Acre, em maio deste ano.
Figura controversa no cenário político e empresarial acreano, Narciso Mendes é dono do jornal "O Rio Branco" que em 1989 estampou a manchete "PT sequestra Abílio Diniz" e teve o nome envolvido em um suposto plano para assassinar o então governador Jorge Viana (PT). Hoje, segundo o livro, Mendes é aliado do atual governador Tião Viana (PT), irmão de Jorge.
A compra de votos para a reeleição de FHC, no entanto, ocupa apenas dois capítulos e pouco mais de 30 páginas do livro.
Desde 2000, quando integrou a equipe de "Caros Amigos" que revelou a existência de um filho do ex-presidente com uma jornalista da TV Globo (recentemente colocada em dúvida por um exame de DNA), Palmério Dória vasculha o governo tucano.
No livro, ele usa dados colhidos ao longo de anos para preencher lacunas de uma história cujos pilares são reportagens publicadas em grandes veículos como "Veja", "IstoÉ", "O Estado de S, Paulo", "O Globo", além da "Folha", que noticiaram fartamente as suspeitas de irregularidades no governo tucano, anos antes do escândalo do mensalão.
"Não é um livro sobre a história de FHC mas sobre a história do esquema FHC", disse o autor ao iG .
Dória traz detalhes e depoimentos inéditos sobre o relacionamento do ex-presidente com a jornalista Miriam Dutra, a operação midiática para abafar o caso, a construção da candidatura, os negócios suspeitos de Paulo Henrique Cardoso, denúncias de caixa dois de campanhas, a montagem do Instituto Fernando Henrique Cardoso na sede do antigo Automóvel Club de São Paulo, os acordos do tucano com a Casa Branca e, principalmente as privatizações.
Neste ponto o livro remete a "Privataria Tucana", de Amaury Ribeiro Jr., publicado pela mesma Geração Editorial em 2011 e citado no prefácio de "O Príncipe da Privataria".
A principal diferença é que enquanto "Privataria Tucana" focava no ex-governador José Serra, os protagonistas livro de Dória são Sérgio Mota e o próprio FHC.
O publisher da Geração, Luiz Fernando Emediato, diz que foi pressionado por interlocutores do ex-presidente para engavetar a nova publicação.
Procurado por meio da assessoria de imprensa do Instituto FHC, o ex-presidente se recusou a comentar o assunto. Em conversas reservadas tucanos próximos ao ex-presidente consideram "O Príncipe da Privataria" mais uma "peça de propaganda do PT" recheada de histórias "requentadas", publicada às vésperas do julgamento dos embargos do mensalão pelo Supremo Tribunal Federal e um ano antes da eleição presidencial.
Palmério Dória nega enfaticamente a alcunha de petista. "O único 'ista' que aceito é jornalista. Se o livro vai ser explorado ou não, é outra história", afirmou.
Para o autor, a publicação pode trazer contribuições para o debate sobre a reforma política ao revelar a fórmula histórica de barganha entre governos e parlamentares. "A reforma é o único jeito que existe. Não tem outra saída", disse ele.
Segundo Dória, não foi preciso ouvir Fernando Henrique para escrever o livro. "Ele é mimoseado pela imprensa e pela mídia. Em nenhum momento pensei em ouvir Fernando Henrique. Este livro tem um ponto de vista e uma linha", afirmou.
"O Príncipe da Privataria" terá um lançamento nesta terça-feira no Instituto Barão de Itararé e outra na livraria Saraiva do shopping Pátio Paulista, ironicamente no dia 10 de setembro, um dia depois da posse de Fernando Henrique na Academia Brasileira de Letras.
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