Volta Naldinho!
Por José Roberto Lopes Padilha - 01/05/2014, 10h02
Eram 22 horas e o Fluminense acabava de entrar em campo naquela quarta-feira para enfrentar o Tupi, em Juiz de Fora. Quanto a mim, como gratidão, deveria desligar a televisão, pegar uma folha em branco e enfrentar com minha caneta uma enorme tristeza. Precisava, devia e gostaria de vencê-la para escrever sobre o Naldinho. Foi uma quarta que, quando tomou notícia sobre seu passamento, não poupou lágrimas a inundar nossos jardins, dar uma injeção de ânimo no desidratado Rio Paraíba do Sul, nos mantendo recluso dentro das nossas divagações. Foi uma tarde/noite a nos fazer refletir sobre aquelas pessoas bacanas que passam pela vida da gente e, de repente, passa um carro de som avisando que eles passaram de vez pela vida da gente. Desta vez nem um carro passou, a semana é que se foi, e ele, infelizmente, foi junto. O texto, enlutado, só agora teve coragem de sair do papel.
Conheci poucos amigos tão alegres e divertidos como ele. Ronald Santos Lima era a cara de uma popular nobreza, que desfilava impecável tanto pelos campos de futebol como nos salões glamourosos dos bailes e shows do CAER. Aonde havia um camarote a coadjuvar um sofisticado evento, lá estava ele em sua mesa cativa, seu whisky 12 anos, depois trocado pelo vinho do Porto, a acalentar todo o prazer que ele fazia questão de brindar com seus amigos. Quando ele se mudou para a nossa rua, a Barão de Entre-Rios, ninguém foi mais barão do que ele. Durante a primeira década do nosso bloco carnavalesco, espalhava mesas e cadeiras pelas ruas a receber todos que vinham ali se divertir e comemorar o Reveillon com a gente.
No seu mundo encantado, seus Opalas eram limusines, suas casas sempre erguidas em avenidas Vieira Souto tamanho o valor e o orgulho concedido a tudo que possuía. Três Rios era a Pasárgada em que ele era o Rei amigo de todo mundo, mas neste mundo surreal, lírico e parnasiano, de verdade mesmo havia uma rainha, a Arlinda, e suas quatro princesas a lhe render carinho e recolocar, sempre que possível, seus pés de volta ao realismo.
Depois que Naldinho se mudou, nenhum portão da nossa rua se escancarou pra cidade. Nenhuma outra mesa foi estendida, cadeiras algumas foram postas à degustação. Todos por ali continuaram felizes, amigos, portões ainda se abrem e fecham para os carros, mas não tem mais convívio, gincana, fogos, festança porque ninguém herdou sua capacidade de transformar silencio em festa. Mau humor em alegria, enfrentar os dissabores com uma fina ironia. Se a Barão de Entre-Rios jamais será a mesma, os bailes caeranos não terão o mesmo glamour, restou ao Bloco da Barão, cujo enredo 2006 foi VOLTA, NALDINHO, talvez prevendo o tamanho de um precoce saudade, carregar por suas alas traços de uma nobre fidalguia.
Certos dias, acordamos e descobrimos novas rugas. Em outros, o espelho nos mostra que os cabelos se foram ou trocaram de cor. Nossa cidade cresce, as crianças recém batizadas já sobem ao altar, retornam com netos. Tudo conforme manda o criador e o figurino. Mas quando ele, espelho, devolve uma amargura, mesmo depois do Fluminense ter vencido por 3x0, eliminando o jogo da volta, é porque nos foi retirada uma preciosa referência, que nos pregava seguidas lições de vida. Descanse em paz e obrigado, amigo, pelo prazer de verdade que foi a sua companhia.
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