RH ainda é mal compreendido
CLAUDIOMARQUES
04 Agosto 2014 | 15:50
Altos executivos valorizam gestão de talentos e treinamentos, mas não enxergam resultados claros das ações, segundo pesquisa
GUSTAVO COLTRI
Há uma dissonância entre o que fazem os profissionais de recursos humanos e o que pensam os líderes das organizações. Uma pesquisa da consultoria Affero-Lab com 50 CEOs de grandes companhias do setor industrial do País indica que, apesar de valorizarem a importância da gestão de talentos, os executivos não mostram empolgação quando avaliam as ações de treinamento e desenvolvimento.
O levantamento é um novo recorte de outro estudo realizado em fevereiro com executivos de diversas posições. “As áreas de operações ou funcionais não reconhecem com tanta ênfase a questão de gestão de talentos e desenvolvimento de liderança. Os CEOs são mais alinhados”, diz Daniel Orlean, sócio-diretor da Affero-Lab.
Mesmo assim, ainda há um certo ruído na relação executivos e a área de RH, segundo ele. Entre os entrevistados, 56,3% não dizem estar satisfeitos nem insatisfeitos quando avaliam as ações de treinamento e desenvolvimento (T&D) promovidas, 22,9% se declaram insatisfeitos, e só 20,8% satisfeitos. No entanto, 72,9% acreditam que essas medidas sejam muito importantes, 89,6% consideram alta a relação entre gestão de talentos e produtividade e 45,8% colocam a gestão de talentos como um dos principais desafios para os negócios.
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“Percebemos que existe uma falta de visão integrada a respeito do que as ações de RH trazem de resultado objetivamente para as empresas. E encontramos dificuldades de os profissionais de RH mostrarem os resultados para os executivos”, diz.
Quando o assunto é a tomada de decisões, a falta de pleno entendimento entre RH e executivos permanece: 18,7% dos CEOs não envolvem ou quase não envolvem o RH nas principais definições estratégicas – o que o especialista considera um porcentual alto demais. “Isso pode ter várias causas: uma é de que o RH não conseguiu se posicionar na empresa como estratégico; a outra é de que o CEO se sente autossuficiente.”
Solução. De acordo com especialistas em gestão de pessoas, as companhias que aproximaram a área de recursos humanos do negócio contam com o respaldo das lideranças e adotam métricas para mostrar como as ações – de treinamentos, pacotes de benefícios, planos de carreira e ambientes de trabalho mais aconchegantes – trazem resultados. “A liderança da empresa tem de estar convencida da importância da preparação do capital humano como forma de alcançar os objetivos. Sem isso, dificilmente ele vai investir”, diz o diretor de desenvolvimento de mercado da consultoria Mercer no Brasil, Marcelo Ferrari.
Em empresas em que o RH ainda precisa dar um passo mais definitivo em direção a uma posição estratégica, a primeira medida a ser tomada, segundo ele, é persuasão do público interno. “É uma discussão aberta de sensibilização da liderança, porque mudanças na empresa terão de ocorrer (para envolver a área de recursos humanos no centro das decisões das diversas divisões das companhias).”
Nesse processo de convencimento, Ferrari diz que as equipes de RH devem fazer diagnósticos mensais do cenário do planejamento estratégico da companhia e procurar instrumentos que mostrem como o capital humano pode contribuir para atingir as metas dos executivos. “Hoje, temos métricas de recursos humanos. Elas devem ser avaliadas associadas aos resultados da organização. Se há alto porcentual de turnover (desligamentos, alta rotatividade de pessoal) na empresa, pode ser criado um modelo de competências a partir disso e implementado ações. Um tempo depois, se esse problema diminuir, é possível estabelecer uma relação de causa e efeito.”
A presidente do Grupo Foco, Eline Kullock, também ressalta a importância dos investimentos na formação dos gestores, os responsáveis pelas gestão de talentos nas organizações. “Uma corrente é tão forte quanto forem os seus elos. Então, mesmo que se faça pesquisas internas de engajamento, treinamentos de pessoas, o trabalho se perde se o gestor for ruim.
Por meio de treinamentos e de processos de coaching. a preparação individualizada dos líderes para a boa gestão das equipes e para o efetivo uso das ferramentas de RH são muito importantes, na opinião de Eline, para que os esforços de investimento no capital humano não se percam. “Por vezes, o jovem executivo é muito bem preparado na competência, mas não para gerenciar as pessoas.”
Para a diretora da consultora Hay Group, Vanessa Fernandes, a aproximação das diversas áreas de negócio em relação à área de recursos humanos também pode ajudar no posicionamento mais estratégico. “Existem, atualmente, grandes figuras de RH que não são originalmente dessa área”, explica.
Experiência. Por duas décadas como executivo de negócios no setor farmacêutico, Miguel Monzu sentiu em vários momentos falta de um apoio mais efetivo dos profissionais de recursos humanos para realizar a gestão de suas equipes. Quando ele chegou ao posto de diretor de RH da AstraZeneca no Brasil, em 2009, passou a implementar medidas para dar a sua nova divisão um papel estratégico.
“Queria mudar para um modelo mais participativo, que eu gostaria de ter tido quando estava do outro lado. Primeiro, definimos que modelo utilizaríamos entre os disponíveis no mercado. Depois, selecionei que profissionais da equipe poderiam exercer as funções de business partners (pessoas de RH que entendem bem do negócio e ficam junto às diferentes áreas, dando o primeiro atendimento aos gestores). E a terceira fase do projeto era vender o modelo para os clientes internos”, diz Monzu, que há um ano acumulou também a comunicação corporativa da AZ Brasil.
A montagem da nova estrutura e o processo de convencimento das outras lideranças da organização levou um ano até a implementação, em 2010. Hoje, a equipe de RH tem 11 pessoas, quatro delas atuando como business partners. “Acho que boa parte do nosso sucesso está no desenvolvimento de gestores, temos um trabalho muito forte de desenvolvimento de lideranças e também de gestão de talentos. Além disso, investimos muito em qualidade de vida”, diz.
Monzu leva como orientação para seu trabalho a máxima de que pessoas qualificadas e mais felizes alcançam resultados melhores. “Se a empresa tem um resultado de vendas bom é porque os nossos resultados também são bons”, defende.
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